A degradação moral do TSE
O Tribunal Superior Eleitoral, que já é, em si, uma paquidérmica e onerosa extravagância brasileira, desmoraliza-se por completo ao longo das 38 páginas do relatório Arquivos do 8 de janeiro: por dentro da força-tarefa judicial secreta para prisões em massa, assinado pelos jornalistas Ely Vieira e David Ágape. A denúncia eclodiu esta semana - não no Brasil, o que já diz muito sobre o medo que o atual regime infunde a redações livres, mas nos EUA, no site Civilization Works, do jornalista norte-americano Michael Shellenberger, o mesmo que desvendou o escândalo dos Twitter Files em 2024.
A história deveria ter vindo à tona ano passado, quando Glenn Greenwald e Fábio Serapião tiveram acesso a mensagens de assessores de Alexandre de Moraes e publicaram, na Folha de S. Paulo, um desfile de truculências e de atos fora do rito legal que ficou conhecido como "Vaza Toga". Mas os demais capítulos da série anunciada não saíram. Nada mais se disse. Silêncio profundo. E eloquente.
Eis, então, que Vieira e Ágape resolveram engolir o medo e cuspir a verdade, em inglês e em português, sobre o que descobriram nas trocas de mensagens de Cristina Kusahara, chefe de Gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e Eduardo Tagliaferro, o perito que Moraes, então presidente do TSE, havia escalado para chefiar sua recém-criada AEED, uma assessoria de "enfrentamento da desinformação".
A revelação dos diálogos expõe um ministro operando sem freios nem limites em uma fúria inquisitorial contra brasileiros comuns colocados no paredón por suas opiniões políticas. Sob pressão do ministro, a chefe de Gabinete foi implacável: a vontade de Moraes deveria prevalecer sobre dúvidas e ressalvas de ordem técnica ou legal. "Não podemos nos dar ao luxo de ficar filosofando", chegou a digitar para Tagliaferro.
Tagliaferro está no exterior anunciando que contará, lá fora, tudo o que sabe sobre os dias de fúria de Moraes para transformar o TSE em uma polícia política. O método? Prender primeiro, perguntar depois. Se nenhuma prova houvesse contra seu Claudiomiro ou dona Vildete, Kusahara mandava Tagliaferro produzir uma certidão positiva (para manutenção da prisão) ou negativa, com base em opiniões postadas em rede social. Os atos do 8 de janeiro não eram individualizados. As postagens eram. Azar do ambulante Ademir Pinto da Silva, que nem esteve nos protestos. À tardinha, se dirigiu ao acampamento militar para vender bandeiras e quetais. Acabou preso. Na falta de provas que o implicassem nos atos, o TSE se baseou num velho tuíte de 2018 em que fazia críticas a Lula e ao PT. Certidão positiva para ele. Quatro meses de prisão, e uma condenação.
Tenho a impressão de que, à frente, serão os carrascos a suplicar anistia ao povo.
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