O acasalamento

Pode o regimento interno de um poder não eleito prevalecer sobre o texto de uma Constituição escrita por representantes que o povo escolheu livremente? Em março de 2019, o Brasil teve a chance de dizer não à gambiarra jurídica montada pelo Supremo Tribunal Federal para assumir poderes absolutos, livres do controle popular.

Mas, como no final dos anos 20 e no início dos anos 60, parte da elite política e intelectual brasileira abriu alas a um regime de exceção por conveniências de ocasião. Como o que começa mal termina pior, corto caminho para dizer, a quem andou distraído, que o terrível saldo destes seis anos de abusos da juristocracia brasileira está retratado no artigo Um golpe de Estado na Suprema Corte do Brasil, publicado pelo Wall Street Journal, referência para investidores e tomadores de decisão ao redor do mundo.

O texto de Maria Anastasia O'Grady, que cobre América Latina para o WSJ, descreve como o Brasil ficou à mercê de um regime que censura, sufoca e prende opositores políticos e cidadãos comuns de índole pacífica mas, talvez seu erro, espinha ereta. A certa altura, porém, a experiente colunista do Journal reporta uma percepção importante. "As elites estão começando a reclamar dos juízes embriagados de poder."

Tente imaginar como esta frase chega a empresários e CEOs de outras partes do mundo com interesse, real ou potencial, no Brasil. E suponha que publicações como o Journal, o Financial Times e a revista The Economist resolvam mover sua lupa para os negócios das famílias de vários ministros da Suprema Corte brasileira, um assunto que ganha relevância a partir da decisão da Casa Branca de aplicar a lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes por violação de direitos humanos no Brasil.

É possível que a punição alcance o sustentáculo econômico do ministro -o escritório de advocacia da família. Se a Magnitsky alvejar outros ministros da corte que têm apoiado as ações autoritárias de Moraes, ter-se-á o desnudamento de um absurdo que a ex-corregedora do Conselho Nacional de Justiça, Eliana Calmon, denunciou ao site Antagonista. "Naturalmente, existe uma divisão familiar. Ou seja, a mulher fica com o poder econômico - os escritórios de advocacia. E o marido fica com o poder político, dentro do Poder Judiciário. E desta forma eles ganham muito, e têm o poder na mão. Isso é, realmente... um acasalamento perfeito! E que rende muito dinheiro."

Eliana não é nada popular entre ministros do STF que, em 2023, decidiram, por 7 a 4, que podem, sim, julgar casos de interesse de escritório de advocacia de parente ou cônjuge. O impedimento legal vigente até então foi removido.

E a moralidade também.


Eugênio Esber em GZH de 15/08/2025

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